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PROGRAMAÇÃO:
JANEIRO de 2013
Sala de exibições
Pequeno auditório
Casa das Artes de V. N. de Famalicão
Parque de Sinçães - V. N. de Famalicão

A LOUCURA DE ALMAYER de Chantal Akerman
Sinopse
1950. Almayer (Stanislas Merhar) é um comerciante europeu a viver na Malásia. Aí, casa
com Zahira (Sakhna Oum), uma mulher malaia de quem tem uma filha, de nome Nina. Decidido a
dar o melhor à filha, Almayer aceita a proposta de Lingard (Marc Barbé), seu sogro, para que a
criança seja levada para um colégio interno para ser educada como uma europeia. Os anos
passam e, após a morte de Lingard, Nina (Aurora Marion) regressa para a casa do pai. Porém,
apesar da sua grande beleza e educação, sente-se infeliz e totalmente desenquadrada, quer da
sociedade europeia para a qual foi educada, quer da do seu próprio país ou família. E é então que
acaba por se envolver com Daín (Zac Andrianasolo), um delinquente da zona. Isso causa um
enorme desgosto em Almayer que amava a filha até à loucura, e que nunca mais se recompõe.
Realizado por Chantal Akerman um drama livremente inspirado no primeiro conto de Joseph Conrad. "A Loucura de Almayer", escrito em 1895. "A Loucura de Almayer " foi um dos filmes seleccionados para o Festival de Veneza 2011.
Ficha Técnica
Título original: La Folie Almayer (Bélgica / França, 2011, 127 min.)
Realização e Argumento: Chantal Akerman
Interpretação: Stanislas Merhar, Marc Barbé, Aurora Marion
Fotografia: Raymond Fromont
Montagem: Claire Atherton
Produção: Artémis Productions
Estreia: 25 de Outubro de 2012
Distribuição: Clap Filmes
Classificação: M/12 anos
Críticas
Luis Miguel Oliveira, Público de 1 de Novembro de 2012
Oito anos depois de Amanhã Mudamos de Casa Chantal Akerman regressa à ficção, adaptando uma história de Joseph Conrad. Pequeno parêntesis: podemos aceitar o argumento que defende que, passados os anos 70 (e as ficções “estruturalistas”: Jeanne Dielman, Je Tu Il Elle), a obra mais relevante de Akerman foi feita fora da ficção, em zonas de fronteira entre géneros ou mesmo cristalinamente instaladas dentro das coordenadas do documentário entendido no seu sentido comum; aceitamos o argumento, mas levantamos o caso do belo A Captiva (de 2000), ficção delirante construída no encontro (maravilhoso e monstruoso) entre Proust e Vertigo. O facto é que Amanhã Mudamos de Casa, segunda insistência de Akerman na comédia de inspiração clássica (depois de Um Divã em Nova Iorque, de 1994), era provavelmente o mais frouxo filme de toda a obra da realizadora belga. Bom vê-la parar de bater nessa tecla, e à boleia de Conrad partir para as paragens, pantanosas e doentias, da Malásia - em francês, “Malaisie”, quase o mesmo que “malaise” (doença), coisa que nalguns momentos não é indiferente na maneira de os actores pronunciarem as palavras. Pressente-se a constelação de temas cara a Akerman (em especial, no recorte, e destino lançado em flashback, da personagem de Nina), e nem tudo do “comentário colonial” de Conrad é elidido. Mas em primeiro plano fica mesmo a “doença tropical”, a história da loucura de um homem (o dito Almayer, Stanislas Merhar, actor que vem da Captiva) a desfazer-se entre o fracasso e a impotência, emoldurada pela paisagem tropical (a vegetação, os pântanos: casamento impossível, mas muito bem imaginado por Chantal, entre Wind Across the Everglades e Apichatpong) e todas as cores da natureza, não muito diferentes - aliás é por aí que o filme começa - das de um cabaret manhoso, a transformar a tradicional “indolência” colonial em veneno espesso, e enleante como as baladas de Elvis que Almayer toca no seu gira-discos.
Uma utopia asiática
João Lopes, Cinemax de 27 de Outubro de 2012
Nome central da história moderna do cinema belga, Chantal Akerman está de volta às salas portuguesas, com "A Loucura de Almayer": uma versão livre do primeiro romance de Joseph Conrad, deambulando pelas ilusões e desilusões do colonialismo europeu.
Chantal Akerman (nascida em Bruxelas, em 1950) é uma daquelas autoras do cinema europeu que, apesar de um importante trabalho regular desde a década de 70 (foi, nessa altura, um dos nomes revelados pelo Festival da Figueira da Foz), se tem mantido nas margens dos mercados. Daí que importe, no mínimo, sublinhar a importância desta estreia: "A Loucura de Almayer", o seu título mais recente, chegou às salas portuguesas (aliás, em paralelo com a retrospectiva que o DocLisboa lhe dedicou).
Tal como em "A Cativa" (2000), adaptado de "A Prisioneira", de Marcel Proust, também aqui se trata de refazer uma fortíssima referência literária: "Almayer's Folly", primeiro romance de Joseph Conrad, publicado em 1895. Refazer e deslocar: Akerman transfere a acção para a Malásia de 1950, preservando a dimensão trágica da personagem central, encarando a sua filha (nascida de uma mulher malaia que enlouqueceu) como a impossível concretização da sua utopia asiática.
Sendo uma tragédia intimista, "A Loucura de Almayer" está longe de ser um filme "psicológico", pelo menos no sentido tradicional que a classificação envolve. Aquilo que Akerman filma é a estranha e inquietante desproporção entre o desejo da personagem central e as determinações de um mundo que o seduz, tanto quanto com o confunde. No limite, Almayer simboliza as contradições do colonizador, dividido entre o delírio da sua visão e a crueza do lugar que ocupa.
Stanislas Mehrar, que já tinha sido o protagonista de "A Cativa", regressa interpretando a personagem de Almayer. A sua presença é também exemplar da lógica narrativa de Akerman e da sua pedagogia existencial (recorde-se que ela é também professora): mais do que um "intérprete" de estados de alma, ele é um corpo estranho ao cenário exuberante, por assim dizer procurando um lugar que concretize o seu imaginário e satisfaça a sua imaginação. "A Loucura de Almayer" é, afinal, uma odisseia sobre a difícil arte de construir uma identidade.
