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Rangum, Birmânia, 1917. Edward, um funcionário público do Império Britânico, foge da sua noiva Molly no dia em que ela chega para se casar. Durante as suas viagens, porém, o pânico dá lugar à melancolia. Contemplando o vazio da sua existência, o cobarde Edward interroga-se sobre o que terá sido feito de Molly... Determinada a casar e divertida com a atitude de Edward, Molly segue-lhe o rasto neste grande tour asiático. Prémio de melhor realização no Festival de Cannes 2024.
Grand Tour em Cannes: uma valsa a dois tempos Vasco Câmara, Publico de 22 de Maio de 2024 É a entrada de Miguel Gomes na competição de Cannes. Um filme em dois tempos, o de Gonçalo Waddington e o de Crista Alfaiate.
Há tanto tempo que Molly corre atrás do seu noivo Edward, um funcionário do Império Britânico destacado na antiga Birmânia, em Myanmar, que já não pode assegurar que ele não tenha perdido entretanto a sua cabeleira castanha e seja hoje careca. "Hoje" é o ano de 1917. Há sete anos que ela não lhe põe a vista em cima.
Molly (Crista Alfaiate) envia-lhe telegramas a anunciar que vai chegar, mas Edward (Gonçalo Waddington), — um cobarde ou um emancipado dos enlaces com o mundo? — escapa-se-lhe. É por isso que Grand Tour, filme que não poderá ser confundido com uma apologia do compromisso conjugal, foi rodado em Myanmar (antiga Birmânia), no Vietname, na Tailândia, nas Filipinas, em Singapura, no Japão e na China, ao correr do périplo destes amantes putativos pelo continente onde as aventuras se perdem e as pessoas se desencontram — antes de morrerem ou antes de se libertarem, nos dois casos acontecimentos irreversíveis e drásticos.
Na realidade, Crista Alfaiate e Gonçalo Waddington nunca saíram de um estúdio em Roma. Os cenários construíram esta Ásia de cinema, de vegetação e de sombras, com suplemento de imaginação acrescentado pela profundidade da fotografia a preto e branco. O espectador pode sentir-se a ver O Expresso de Xangai, de Josef von Sternberg (1932).
Uma equipa de argumentistas, Miguel Gomes, Maureen Fazendeiro e Mariana Ricardo, andou, antes de escrever a história de Molly e Edward, a repetir realmente esse périplo, registando simultaneamente um arquivo de imagens contemporâneas. O resultado é uma espécie de documentário imaginado. É com ele que o estúdio trava diálogo no filme de Miguel Gomes, a segunda presença em 18 anos de um filme português na competição do Festival de Cannes — depois de Juventude em Marcha, de Pedro Costa.
O filme dela e o filme dele
Há dois filmes em Grand Tour — não se dizia também que havia dois filmes em Tabu (2013)? Há o filme de Edward e o filme de Molly. Começamos com a melancolia dele, a contemplação da sua existência, o pânico de se abandonar ao mundo. Passaremos depois, na segunda parte, à determinação e à alegria dela. Molly é uma conquistadora, não tem medo do mundo, ponto. Ao colocar-se no encalço de Edward, e como se o filme então voltasse a começar, ela vai ao encontro do descarrilamento do comboio, que já presenciáramos, momento a partir do qual o noivo deixou de ser localizado.
Dir-se-ia que a melancolia, o medo, o fechamento ao mundo, é o território de Gomes. É com surpresa, por isso, que vemos Crista Alfaiate levar a melhor sobre Gonçalo Waddington e a parte dela ser mais contagiante do que a parte dele. A Miguel Gomes o que é de Miguel Gomes: o realizador ter-se-á interessado mais pela personagem feminina do que pela masculina? É um problema de casting?
Há outro modo de o dizer: Grand Tour começa a querer seduzir-nos logo de início, ainda antes de conseguir envolver-nos, esforço que é evidente na sequência de chegada a Saigão, no Vietname, em que nos é entregue logo uma valsa, e logo esta, o Danúbio Azul, e uma coreografia em câmara lenta de motos. O filme começa logo aí a valsar muito, não obstante mostra mais dificuldade em revelar-se.
Haverá coisas mais subtis, como as canções de Frank Sinatra, a progressiva introdução do português como língua franca ao longo do périplo, disseminando-se ao mesmo tempo que a interrogação anti-imperialista germina ("Vamos sair daqui sem perceber nada"); ou então o belíssimo, belíssimo final. São exemplos de labor de artífice, de ufania de criador, introduzidos paralelamente, nem antes nem depois, ao envolvimento emocional do espectador.
Ficaremos com Crista Alfaiate e o seu riso a caminho da onomatopeia: a sua flapper, nome que se deu à jovem mulher livre, enérgica e desinibida dos anos 20 que alardeava o desinteresse pelos códigos ou restrições sociais, é uma composição carregada com o seu próprio tempo. Gostamos de acreditar que Crista é uma surpreendente revisitação da it girl dos anos 20 que se chamou Clara Bow.