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PROGRAMAÇÃO: Outubro 2016

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Pablo Larraín

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Sala de exibições Pequeno auditório
Casa das Artes de V. N. de Famalicão
Parque de Sinçães - V. N. de Famalicão

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O CLUBE de Pablo Larraín

Sinopse

Quatro sacerdotes vivem isolados numa velha casa junto ao mar, em La Boca (Chile). A única companhia é uma freira que cuida deles e lhes vigia os passos. Pecadores, eles foram excomungados pela Igreja e estão ali para expiarem os crimes mais ignóbeis. Tudo acontece rigorosamente como o esperado e cada dia que passa nada altera as suas vidas. Até que é para lá enviado um quinto homem, também caído em desgraça. A sua chegada vai transformar toda a dinâmica da casa, fazendo-os regressar ao passado e reavivando as suas culpas e dores.

Escrito e realizado pelo chileno Pablo Larraín ("Tony Manero", "Post Mortem", "Não"), um filme dramático que arrecadou o Grande Prémio do Júri no Festival de Cinema de Berlim e foi também nomeado para Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro. A Alfredo Castro, o "actor-fetiche" de Larraín, juntam-se Roberto Farías, Antonia Zegers, Marcelo Alonso e Jaime Vadell, entre outros.

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Ficha Técnica

Título original: El Club (Chile, 2015, 98 min.)
Realização: Pablo Larraín
Interpretação: Alfredo Castro, Roberto Farías, Antonia Zegers
Argumento: Guillermo Calderón, Pablo Larraín, Daniel Villalobos
Produção: Juan de Dios Larraín, Pablo Larraín
Musica: Carlos Cabezas
Fotografia: Sergio Armstrong
Montagem: Sebastián Sepúlveda
Distribuição: Alambique
Estreia: 8 de Junho de 2016
Classificação: M/18

Perturbante, sabedor no dosear dos olhares e silêncios, mas acutilante sempre que usa as palavras, certeiro no casting (onde não faltam habitués do cinema do realizador) e capaz de, mesmo com uma belíssima direção de fotografia, dar àquele lugar perdido um tom de pesadelo permanente, O CLUBE representa o melhor que o cinema de Larraín já nos deu a ver. -Medeia Magazine

Muito merecido, foi o destaque dado no palmarés a Pablo Larraín, premiado com o Grande Prémio do Júri, pelo seu olhar sombrio e implacável sobre a Igreja Católica e as crenças religiosas, no formidável O CLUBE, no qual observa também as dinâmicas da repressão. - Público O formidável quinto filme de Pablo Larraín começa por parecer excêntrico, evoluindo para a arrepiante história de padres criadores de galgos numa ilha varrida pelo vento. - The Guardian

Uma experiência intensa e invulgar, num tom mais próximo de TONY MANERO e POST MORTEM do que do comparativamente mais ligeiro NÃO, filmes anteriores do realizador. - Variety Um filme ousado e directo, embora de uma inteligência cortante, que demonstra tanto um humor negro como uma cólera justificada, é ao mesmo tempo um thriller apaixonante, crítica social incendiária e fábula moral mordaz. - The Playlist

O Chile, a inocência e o pecado
João Lopes, DN de 9 de Junho de 2016

Convém corrigirmos o reconhecimento que nos leva a apontar Pablo Larraín como um dos nomes fundamentais do cinema contemporâneo do Chile. Creio que vale a pena sublinhar que Larraín é um dos nomes fundamentais do cinema contemporâneo - ponto final. Antes do admirável Neruda, sobre Pablo Neruda (apresentado em Cannes, na Quinzena dos Realizadores), realizou esta viagem assombrada pelos bastidores do catolicismo. Literalmente: O Clube faz o retrato, ao mesmo tempo realista e dantesco, de uma casa discreta, algures numa praia esquecida da nação chilena, onde são recolhidos padres que foram acusados de crimes pedófilos ou de apropriação de bebés de mães solteiras. Evitando qualquer generalização demagógica, Larraín observa as regras internas de um pequeno universo em que a nitidez institucional se descobre abalada pelo súbito relativismo das noções de inocência e pecado. E se o cinema é, antes do mais, uma arte do espaço, raras vezes sentimos a claustrofobia de um território que não desiste da ilusão da pureza - e do tempo que isso consome.

O clube das almas penadas
Luís Miguel Oliveira, Publico de 8 de Junho de 2016

É inteligente o desenho deste grupo de personagens - sacerdotes caídos em desgraça - perdidas na sua entropia, em cenas que oscilam entre o burlesco e o sinistro: O Clube, de Pablo Larraín.

Como em Tony Manero ou, de modo bem mais explícito, em Não, Pablo Larraín continua em O Clube a evocar os fantasmas chilenos, e a sua persistência no Chile contemporâneo. E talvez os fantasmas de O Clube sejam os mais perturbantes e complexos que já filmou, porque não relevam apenas de questões sociais ou políticas directamente relacionáveis com a ditadura de Pinochet, têm uma origem ao mesmo tempo mais difusa e mais abrangente, e frequentam um território onde as armadilhas abundam: a Igreja Católica, entre os traumas recentemente manifestados (a pedofilia) e o passado colaboracionista com a ditadura.

O “clube” do título é uma espécie de casa de repouso para sacerdotes caídos em desgraça. Situa- se em La Boca, zona costeira e relativamente isolada que se presta bem ao papel de lugar de desterro para padres que a hierarquia da igreja quer manter longe da vista - e da justiça. Vivem lá quatro, guardados por uma governanta, ex-freira, possuidora de um sentido de missão ligeiramente “borderline”, e afastados da vida religiosa oficial entretêm-se essencialmente com as corridas de galgos (“o único cão mencionado na Bíblia”), treinando um animal campeão ou potencial campeão. No princípio do filme chega outro padre, também condenado ao desterro, e um homem que vem atrás dele. Numa sequência bastante impressionante, esse homem, à porta do “clube”, desfia uma litania feita de uma mistura de acusações e recriminações mas também de afectos bastante confusos, que revela o passado pedófilo do padre recém-chegado. Possivelmente tomado pela vergonha e pelo remorso, o padre suicida-se. É o acontecimento que põe o filme em marcha, visto que leva à chegada de um outro padre, mais jovem, que anda a investigar e a tentar fechar as residências como o “clube” espalhadas pelo Chile.

É a “nova igreja” contra a “velha igreja”, como com amargura trocista refere um dos padres? De certa forma sim, e da parte de Larraín uma forma inteligente - encontrar o mais parecido com um “herói positivo” dentro da estrutura eclesiástica - de evitar confusões com o maniqueísmo anti- clerical. Mas como diz esse jovem padre, “eu sei porque é que eles estão aqui, resta saber se eles sabem porquê”. O facto de eles “não saberem porquê”, de parecerem ignorantes da própria culpa, desenterra uma questão de mentalidades, de hábitos e conivências dados como “normais” - e não é apenas a questão da pedofilia, num dos casos (um antigo capelão do exército) é a cumplicidade da igreja com os crimes da ditadura que vem à superfície. Paradoxalmente (ou não, mas é aí que o filme se ganha na sua complexidade), essa espécie de inocência manchada, de culpabilidade ignorada, traz humanidade àquele grupo de “zombies”, por horrível que seja o seu passado. São criaturas “fora de tempo” e “fora de lugar”, proverbiais almas penadas que já não estão na Igreja mas também não foram verdadeiramente devolvidas à vida civil. É por isso, também, que O Clube se conclui pela manifestação de um sentido de justiça que não se confunde com a Justiça institucional a que o jovem padre quer destinar os habitantes da residência: chame-se-lhe “justiça poética” ou outra coisa qualquer, é um encontro entre a penitência e a redescoberta, como possibilidade de redenção, de uma vida mais alinhada com os fundamentos cristãos.

Também por isso, pela inteligência no desenho deste grupo de personagens perdidas na sua entropia, em cenas que oscilam entre o burlesco e o sinistro (ou cenas dum burlesco sinistro), sente-se alguma dispersão quando Larraín resolve acompanhar a figura de Sandokan (o homem da cena inicial, também ele uma espécie de alma penada), dar-lhe uma substância humana mas em simultâneo excessivamente sublinhadora do seu desarranjo psicológico (a cena com a empregada da peixaria, bastante grotesca). Como insiste, Larraín, na criação um tanto artificial de uma atmosfera de “espiritualidade”, que se adivinha pretender conciliar a sinceridade (das personagens) com a distância (do olhar do cineasta) mas que resulta sobrecarregada, em particular pelo uso excessivo da música (sempre ou quase sempre Arvo Part), a tombar para um maneirismo “ambiental” a que não faltam, também, os pôr do sol e os reflexos da luz solar na lente da câmara. Enfim, não é um filme perfeito, mas é um filme inteligente, que não consegue tudo o que quer mas aquilo que consegue consegue-o bem.

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