CINECLUBE DE JOANE

Junho 2024
Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão

Programa mensal

de Sean Durkin
6 JUN 21h45
de Ryûsuke Hamaguchi
13 JUN 21h45
de Roman Polanski
20 JUN 21h45
de Lisandro Alonso
27 JUN 21h45

As sessões realizam-se no Pequeno auditório da Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão. Os bilhetes são disponibilizados no próprio dia, 30 minutos antes do início das mesmas.

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6 21h45

IRON CLAW Sean Durkin

Depois do seu sucesso na NWA (National Wrestling Alliance) durante as décadas de 1950/60, Fritz Von Erich (nascido Jack Barton Adkisson, em 1929) tornou-se treinador de Kevin, David, Kerry e Mike, quatro dos seus seis filhos. Mas a sua personalidade dominadora e exigente criou uma enorme pressão sobre os rapazes, incentivando a competição entre eles sem nunca lhes dar margem para falhas, resultando em vários triunfos, mas também numa grande tragédia familiar. “The Iron Claw” mostra a história deste clã sob o ponto de vista de Kevin, o único dos irmãos sobrevivente, e cujos filhos Ross, Marshall e Lacey se tornaram a terceira geração de Von Erich no ringue. Um drama realizado e escrito por Sean Durkin (“Martha Marcy May Marlene”, “O Ninho”) que conta a história da família Von Erich, famosa no competitivo mundo do “wrestling” profissional norte-americano.

Título original: The Iron Claw (2023, EUA/Grã-Bretanha, 125 min)
Realização e Argumento: Sean Durkin
Interpretação: Zac Efron, Jeremy Allen White, Harris Dickinson, Maura Tierney, Stanley Simons
Produção: Tessa Ross, Juliette Howell, Sean Durkin, Angus Lamont, Derrin Schlesinger
Fotografia: Mátyás Erdély
Montagem: Matthew Hannam
Distribuição: NOS Audiovisuais
Estreia: 22 de Fevereiro de 2024
Classificação: M/14
The Iron Claw: ninguém sai daqui vivo Vasco Câmara, Publico

Uma parte da sua graça é ser o anti-Rocky. Daqui ninguém sai redimido ou vingado.


Do enigmático Sean Durkin — por causa do ritmo produtivo, da periodicidade com que nos vai dizendo coisas, apenas três longas metragens em 12 anos; pela sua indecifrabilidade, a forma como nos falou em Martha Marcy May Marlene (2011) e O Ninho (2010) — aparece-nos agora The Iron Claw.
O contexto é todo outro, diferente daquele em que o canadiano surgiu no início do século XXI, quando a sociedade que formara com dois colegas da New York University, a Borderline Films, dele, de António Campos e de Josh Mond, se tornou um pólo produtivo que fazia vibrar de expectativa as esperanças do pós-Miramax, isto é, do cinema indie americano que sobrevivia ao hype dos anos 90 com que Harvey Weinstein formatara o jogo, como uma marca comercial.
Desse trio, que levou mesmo a um "foco" no Curtas de Vila do Conde em 2016, Campos foi o que mais prometeu, por causa do tremendo Afterschool/Depois das Aulas (2008), mas foi também o que mais desiludiu, porque se rendeu à televisão e às séries do streaming. Durkin, kubrickiano como o seu colega (mas mais facção Shining do que Laranja Mecânica), teve para (se) mostrar uma miragem, um filme que se escapava sempre que parecia deixar-se aprisionar num género, fosse ele o thriller conspirativo, o melodrama ou o filme de terror, tão incerto como fracturada era a cabeça da protagonista, uma jovem que tentava sobreviver a uma seita: era Martha Marcy May Marlene e parecia o espectador a sonhar.
O Ninho revisitava o motivo da casa assombrada, mas colava-lhe a ressaca yuppie, resultando uma quimera de filme de terror, de drama conjugal e de filme político que declarava o ocaso do capitalismo.
Digamos então que The Iron Claw põe em relevo a constância do (ainda que) raro trabalho de Durkin, a forma por vezes sibilina mas finalmente obsessiva e feroz como questiona a construção que é o sonho americano — os seus filmes, em suma, mostram derrocadas — evidenciando o lado negro dessa força. Conta a história verdadeira da família Von Erich, astros do wrestling. Eram seis irmãos, treinados e geridos com mão de ferro pelo pai, três deles suicidaram-se, dois morreram prematuramente num acidente e por doença, permanecendo vivo dessa geração, porque entretanto a seguinte está nos ringues, um deles (no filme, interpretado por Zac Efron). A cadeia de acontecimentos, acidentes, doenças, suicídio, criou o mito de uma "maldição Von Erich", algo que Durkin não confirma nem desmente — é por isso que falamos na sua "forma por vezes sibilina" — porque sobretudo disso se serve para ir com as personagens até ao fundo do seu pesadelo, implicando mesmo isso às tantas um plano lá em cima no after life. Isto é, o biopic ou o drama familiar, com uma daquelas figuras de pai fundador e autoritário em que o cinema americano ancorou também a sua (anti)mitologia, é tintado a conto gótico e mortificante e dessa forma Sean Durkin atinge também um dos fundamentos do filme sobre o desporto e na verdade da utopia competitiva: a possibilidade de transcendência, social e humana. The Iron Claw, uma parte da sua graça é essa, é o anti-Rocky, (quase) ninguém sai vivo quanto mais redimido ou vingado.
Mas se assim se possibilita a coerência filosófica, digamos assim, da curta obra do realizador, se as cenas de The Iron Claw, por causa do tom, do registo, dos diálogos — veja-se por exemplo a sequência do date entre Zac Efron (Kevin Von Erich) e Lily James (Pam, que seria sua mulher) —, ainda mantêm uma constituição esquinada, oblíqua, a presença de um género dominador, o biopic, tem as suas consequências: é o menos desformatado, o menos "imaterial", dos filmes de Sean Durkin.
Releva ainda uma "novidade": a presença dos corpos. Durkin nunca foi um realizador "físico". Os seus filmes sempre foram outros tantos estados mentais — a fixação kubrickiana é a culpada. As suas personagens não se impunham pelo corpo. O mundo do wrestling traz, portanto, diferentes implicações, obrigando a uma outra materialidade, não necessariamente densidade, de um universo que se manteve até aqui evanescente, difuso, sinuoso. Não é certo que o cineasta tenha conseguido lidar com essa dimensão, com uma espécie de hiper-realismo que busca o efeito de alienação da realidade. Não é certo que Zac Efron, cujo corpo "bombado" e cabelo têm o efeito perturbador de parecerem um efeito especial em parada, consiga afinal "salvar" a sua personagem.