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Num acto de resistência e busca de justiça para o conflito israelo-palestiniano, o
filme conta a história da aliança (e consequente amizade) entre o palestiniano Basel
Adra e o israelita Yuval Abraham, dois jornalistas que decidiram unir-se para
denunciar a violência e as consecutivas demolições das habitações de Masafer Yatta –
um conjunto de aldeias palestinianas no Sul da Cisjordânia – pelo exército e colonos
israelitas. Vencedor do prémio de melhor documentário na edição de 2024 do Festival
de Cinema de Berlim e nos European Film Awards, e candidato ao Óscar na mesma
categoria, “No Other Land” foi escrito e realizado entre 2019 e 2023 por quatro
activistas políticos: dois palestinianos (Basel Adra e Hamdan Ballal) e dois
israelitas (Yuval Abraham e Rachel Szor).
Na abertura da sessão, no âmbito da rede
shortcutz, será exibida a curta-metragem
Tão Pequeninas, Tinham o Ar de Serem Já Crescidas (2024, 30 min)
de Tânia Dinis: Este filme combina o tratamento ficcional e
documental, e parte do arquivo fotográfico e de imagens reais e do testemunho oral de
várias mulheres, de Trás-os-Montes, Beira, Alto e Baixo Minho, que, entre os anos 40
e 70, vieram para o Porto trabalhar como criadas de servir.
No Other Land: a vida palestiniana sob ocupação, uma coisa sem fim _ entrevista Vasco Câmara, Publico No Other Land: a vida palestiniana sob ocupação, uma coisa sem fim
Basel Adra estudou Direito, mas não pode exercer advocacia. Em Israel, o melhor que poderia arranjar seria um emprego na construção civil. Basel estudou numa universidade palestiniana as leis e os regulamentos aplicados na Zona A, policial e administrativamente controlada pelas autoridades palestinianas, mas vive na Zona C, de administração israelita — 60% do território da Cisjordânia.
"A lei aqui é israelita, a língua é o hebraico. Por isso, achei que o jornalismo e o activismo eram mais valiosos para a minha comunidade", Masafer Yatta, uma série de aldeias, assentamentos rurais, a sul de Hebron.
Um dia entrou em cena Yuval Abraham, jornalista israelita. Masafer Yatta é visitada "desde há muito" por jornalistas-activistas como Yuval, israelitas e internacionais, que querem testemunhar a ocupação do território e a destruição das comunidades pelo Exército e por colonos israelitas. Yuval salientou-se desse círculo. "Temos a mesma idade", na casa dos 30, "ele chegou como jornalista para escrever uma peça sobre o que se estava a passar em Masafer Yatta", conta Basel, "manteve esse ir e vir e fomos falando. Um dia percebemos que queríamos fazer algo de mais importante do que artigos e trabalho de redes sociais e então decidimos fazer este documentário, passar por esta experiência. A relação entre nós desenvolveu-se, tornámo-nos aliados, começámos a planear acções como activistas e tornámo-nos amigos."
São como as duplas nos filmes: tão diferentes que isso só os pode complementar, e a ser assim será o início de uma bela amizade.
Basel apegado a registar o quotidiano e as perdas da sua comunidade; Yuval pensando no bigger picture.
Basel, palestiniano, investindo na memória de gerações da sua terra que quotidianamente é destruída de cada vez que uma escola é arrasada pelos caterpillars israelitas e Yuval, que recusou trabalhar para os serviços secretos do seu país, a ter de se distanciar do grupo onde nasceu e a ser desprezado por ele? De um lado o apego, do outro a renúncia, eis a questão? "Não, não penso que ele se afaste da sua comunidade. Penso que está a tentar convencer a sua comunidade a rejeitar a política do governo israelita de querer controlar milhões de palestinianos e construir colonatos; quer abrir os olhos a essa comunidade, fazê-la sentir-se responsável." Basel responde assim por Yuval.
"Somos diferentes porque viemos de sociedades diferentes e vivemos em condições diferentes. Yuval tem todos os direitos, de movimentos, de voto, leva uma vida normal. Já eu vivo uma vida controlada, um apartheid, negam-me os meus direitos."
Fizeram de facto um filme, No Other Land. Foi nomeado para o Óscar do Melhor Documentário esta quinta-feira, o dia em que falámos, por Zoom, com Basel — Yuval foi tomado pelos seus compromissos de activista —, depois de ter recebido uma mão-cheia de prémios que inclui o de melhor documentário na Berlinale 2024 e nos European Film Awards. Juntou-se-lhes entretanto uma outra dupla israelo-palestianiana, Rachel Szor e Hamdan Ballal.
Não sendo um filme sobre a relação entre Basel e Yuval, No Other Land filtra-a. Sendo antes, então, a história de uma comunidade, com uma cronologia de factos, de acontecimentos, No Other Land capta afinal o isolamento das vidas em relação ao tempo, um interminável ciclo de repetição e de esquecimento.
"A imprensa segue os grandes acontecimentos, a acção. Por exemplo, a Guerra em Gaza. Mas os pequenos momentos, a destruição das escolas e das casas, que como se vê no filme se tornou uma rotina nas nossas vidas, deixou de interessar os jornalistas. Ninguém quer vir aqui cobrir a rotina." (Yuval foi diferente.) Por isso, Basel espera algo da nomeação para o Óscar. "Pode levar mais pessoas a mudar a maneira de pensar se o filme for mais visto. A narrativa palestiniana não tem espaço no jornalismo global. Este filme mostra como é a vida quotidiana sob ocupação. Não terá efeito directo, no entanto, não mudará as coisas directamente no terreno."
Há home movies na aldeia
Quando Basel era miúdo e guardava ovelhas, viu pela primeira vez o pai ser preso. Tinha cinco anos.
Aos sete participou na primeira manifestação. Percebeu aí que os pais eram activistas. Datam dessa altura os primeiros gestos dos habitantes de Masafer Yatta de pegar em câmaras, os primeiros filmes, para registar a entrada dos tanques israelitas que arrasavam as casas e as escolas com a justificação de que as terras tinham de ser destinadas aos treinos do exército.
Captaram mesmo os tiros que paralisaram o jovem Harun.
"Tudo começou nos anos 80 com o estabelecimento de três colonatos. Nos anos 2000 já eram dez. Desde 7 de Outubro até agora já houve outros dez. Isso implica roubar a nossa terra. Perdemos já seis comunidades nesta área. Centenas de palestinianos são alvos de ataques de colonos e de soldados. Esta pressão, os ataques, o viver há muito sem electricidade e sem água, os colonatos a expandirem-se, a criarem postos avançados, tudo isso impede os palestinianos de passearem o gado, de recolherem as colheitas e de cultivarem a terra. Cada ano que passa, mais casas são destruídas, mais colonatos são construídos. Os palestinianos não têm outra alternativa a não ser fugir da sua própria terra."
Quando Basel começou ele próprio a filmar, tudo parecia estar já a acabar. Já velho, o seu pai voltou a ser preso. No Other Land, que recolhe os gestos de uma comunidade, é um acto de resistência através da memória, uma certificação dos antepassados que ali se instalaram na década de 1870.
"A herança é importante para devolver às pessoas o lugar que todos os dias está a ser destruído por bulldozers. É uma comunidade que mantém as suas tradições. Quando se destrói uma comunidade, não se deitam abaixo apenas construções de cimento, destrói-se também um espírito, o facto de as pessoas terem crescido juntas. Por exemplo, as grutas desta comunidade, um bilhete de identidade da área, construídas há mais de cem anos e que eram as únicas casas que as famílias tinham. Hoje são também a única opção para muitos que perderam as suas casas." É lá que vivem Harun, que ficou paraplégico num confronto com o Exército israelita, e a mãe.
"A resistência e a luta contra a ocupação e o activismo têm raízes. Por isso falo do meu pai. Ser criança e ver o meu pai ser raptado pelos soldados significou muito para mim. Não percebia o que se estava a passar à minha volta. Hoje olho para os rostos dos meus sobrinhos e das crianças nas ruas e vejo a mesma incompreensão: 'Porque é que os militares começam a disparar sobre as pessoas?' Cresce-se assim sem ver mudanças — o meu pai foi preso quando eu era criança, foi preso de novo quando eu era mais velho, 20 anos mais tarde —, é uma coisa sem fim. É a vida diária sob ocupação, a forma como vivemos a nossa vida. Não é como em Portugal ou em outro país da Europa."
Basel Adra continuará sempre à espera de ter na sua vida coisas melhores do que os home movies de Masafer Yatta.